Os estoques mundiais de grãos começam a ser recompostos, o que deve continuar interferindo nos preços das commodities. Uma alteração desse ritmo só virá com um aumento de demanda, o que será difícil ocorrer, ou uma quebra de safra por problemas climáticos.
O Usda (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) projeta uma safra recorde de grãos de 2,82 bilhões de toneladas no período 2023/24. Com isso, a sobra mundial de alimentos no período desta safra analisada ficaria em 770 milhões de toneladas. O volume ainda é inferior aos 815 milhões de 2019/20, mas já superior ao do ano imediatamente anterior.
Diante desse novo cenário, a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) relatou uma queda de 19,8% nos preços médios dos cereais em abril, em relação a igual período do ano passado. O trigo, um dos líderes das altas recentes, recuou para o menor patamar de preço desde julho de 2021.
Soja e milho têm desempenho importante nessa recuperação mundial de estoques. A produção do cereal deverá subir para 1,22 bilhão de toneladas, acima do 1,5 bilhão da safra 2022/23. O Brasil é um dos propulsores desse aumento, com safra recorde prevista de até 130 milhões de toneladas em 2022/23, segundo o Usda.
A Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) prevê números menores. Na avaliação do órgão estatal, a safra brasileira poderá atingir 125,5 milhões de toneladas, se a condição climática não interferir até o desenrolar final. A produção brasileira recorde dá ao país um bom potencial de exportação e a possibilidade de voltar a assumir a liderança mundial no mercado externo.
Nos dados do Usda, o Brasil deverá colocar 53 milhões de toneladas de milho no exterior, acima dos 45 milhões dos Estados Unidos. Para 2023/24, o Usda volta a estimar uma liderança mundial nas exportações do produto brasileiro. A China, que sobe as importações para 23 milhões de toneladas, tem cancelado contratos com os norte-americanos e dado preferência ao cereal brasileiro, devido à competitividade de preço.
A Conab trabalha com números mais modestos para as exportações brasileiras. As vendas externas, segundo órgão, deverão somar 48 milhões nesta safra. O ano comercial do Usda e da Conab toma como base meses diferentes.
Neste ano, as menores safras na Argentina e na Ucrânia têm auxiliado as exportações brasileiras. Na próxima, os argentinos voltam a obter safras maiores. Serão 54 milhões de toneladas em 2023/24, bem acima dos 37 milhões deste ano. Na Ucrânia, a produção do cereal, ainda afetada pela guerra, cai para 22 milhões de toneladas, abaixo dos 27 milhões de 2022/23.
A safra norte-americana de milho sobe para 388 milhões de toneladas, 11% a mais do que o produzido em 2022/23. A área de plantio sobe 4%, e a produtividade, que aumenta para 190 sacas por hectare, será 5% maior.
Essa perspectiva de safra maior no Brasil, vinda principalmente da safrinha, alterou os preços internos do milho. O valor atual da saca, segundo o Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), é de R$ 58,8. Há um ano, a saca estava em R$ 86,4, e, em maio de 2021, em R$ 102
O quadro mundial de oferta e demanda de soja também passa por alterações. A primeira avaliação do Usda da safra 2023/24 da oleaginosa indica produção mundial de 411 milhões de toneladas. Nas duas anteriores, a oferta foi de 365 milhões de toneladas, em média.
Com isso, os estoques finais, que eram de 99 milhões em 2021/22, sobem para 123 milhões no período 2023/24. Essa avaliação de produção do Usda ainda deverá ser submetida a uma série de incertezas. Nos Estados Unidos, segundo maior produtor mundial, as lavouras dependem muito do clima. No Brasil, a estimativa de avanço da área em 1,9 milhão de hectares pode não se concretizar, segundo Daniele Siqueira, da AgRural.
Para a analista, há uma queda de preços da soja, dificuldades na obtenção de crédito e perspectivas de rentabilidade menor para o produtor. De outro lado, se ocorrerem os aumentos de áreas e de produção no Brasil e na Argentina estimados pelo Usda, haverá um excesso de oferta da oleaginosa.
Segundo o Usda, a safra brasileira, que foi de 155 milhões de toneladas neste ano, poderá atingir 163 milhões em 2023/24. No mesmo período, a argentina sobe de 27 milhões para 48 milhões. A norte-americana, que foi de 116,4 milhões em 2022/23, tem potencial para atingir 123 milhões nesta safra que está sendo semeada.
Em termos de demanda, o Usda estima um aumento das importações chinesas deste ano para 98 milhões de toneladas. Em 2023/24, serão 100 milhões de toneladas. Siqueira diz, no entanto, que faltou o Usda combinar com os chineses, que preveem importações de 95,4 milhões para a safra 22/23 (outubro de 2022 a setembro de 2023) e 94,2 milhões para o mesmo período de 2023/24.